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5 de set. de 2011

Um mistério chamado: pecado


“Um mistério chamado: pecado”

Desde os primórdios da humanidade o homem e as diversas religiões lutam contra o mal e sua ação no mundo e na vida particular de cada um. O Cristianismo, bebendo das fontes da cultura judaica e grega, acolheu a palavra ‘pecado’ para definir os erros, as imoralidades, as iniqüidades e o rompimento do relacionamento entre Deus e os homens. No entanto, definir o pecado parece ser uma tarefa quase impossível, se pensamos em todo o contexto do mistério do mal e do mistério que envolve o primeiro pecado, ou seja, o pecado original.
Algumas definições viram no pecado como um atrativo enganador, algo prazeroso, mas que nos prende e desvia o nosso olhar do Criador; concepção essa expressa radicalmente por Santo Agostinho na frase por ele cunhada: “o pecado é aversão a Deus e conversão as criaturas”. Já Santo Tomás de Aquino, pensa que se o homem soubesse mesmo onde está ‘pisando’ tomaria mais cuidado e, talvez, nem pecaria tanto, pois para ele o pecado é como uma ‘pintura’ ou ‘moldura’ que reveste de bem aquilo que é mau. Ao longo da história da Igreja, os teólogos lançaram suas flechas para todos os lados tentando atingir o pecado (acertar o alvo, aludimos aqui a própria etimologia da palavra pecado) e defini-lo de uma vez por todas. Entretanto, o que conseguiram foi abrir mais e mais leques de reflexão sobre o assunto. Disso tudo, temos várias definições: o pecado como alienação humana; como processo que se desencadeia na separação de Deus; como desgraça que desumaniza e é desumanizante.
E temos ainda, analisando pela exegese e hermenêutica, as palavras da Sagrada Escritura que tratam sobre o assunto, dando as seguintes definições: hattá – uma ação externa, que representa o erro; awôn – significando uma pessoa que não consegue se desenvolver bem; pésha – que faz menção ao rompimento da Aliança; rashá – que faz referência àqueles que praticam o mal e perseguem os bons. Por vezes, o pecado foi olhado fora do pecador, noutras vezes como parte integrante do pecador. Como nos explana Frei Antonio Moser, ora o enfoque estava sobre o objeto (o pecado cometido), ora sobre o sujeito (o pecador). Mais popularmente o pecado chegou até os nossos dias como ‘grave ofensa a Deus, à Igreja e aos irmãos’. E, ainda numa visão mais personalista, o pecado tomou forma de um grande entrave na vida pessoal do cristão.
Com o passar dos anos, os olhos dos teólogos, principalmente dos se encontram na América Latina, abriram-se para realidade social, estrutural, e sócio-estrutural da qual está imbuída o pecado. Esse foi um grande avanço nos estudos sobre o Sacramento da Reconciliação. Pois, percebeu-se que com os nossos pecados, não ferimos Deus (que não pode ser atingido pelos nossos erros), não ferimos a Igreja (que é essencialmente Santa, sendo apenas ‘pecadora’ por causa de seus membros) e não ferimos somente a nós mesmos (tendo o pecado como uma simples ofensa ao próprio ego). Mais que isso, ferimos a sociedade, a humanidade, ferimos até mesmo o planeta e o ambiente em que vivemos. Quando pecamos damos um passo atrás na construção do Reino de Deus, atrapalhamos (e podemos atrapalhar) o avanço espiritual e social da comunidade. E isso não se resume ao grupo daqueles que crêem; o pecado daqueles que dizem crer acaba atingindo aqueles que decidiram não crer em nada. Essa é a realidade de muitas estruturas de pecado levantadas em nossos dias. E, para mim, resumidamente a mais adequada aproximação de definição do pecado: pecar é tirar um tijolo da construção do Reino de Deus e, conforme o ato, não só esconde-lo, mas destruí-lo, atrasando e dificultando as ‘obras de construção’ da família universal, tanto desejada pelo Senhor.
Essa aversão ao plano de Deus para a história da humanidade vê-se muito bem hoje em tantos ‘projetos intimistas, egoístas e individualistas’ espalhados pelo mundo e divulgados pela mass média. Os inúmeros grupos econômicos, sociais, culturais e religiosos vão se fechando cada vez mais em si mesmos e deixando à beira do caminho muitas pessoas (e até nações inteiras) que não atendem aos seus critérios e exigências. Por exemplo: o G20, não é uma forma disfarçada de dizer que as centenas de outros países estão ‘fora’ de seus planos econômicos e sociais definidos para o futuro?
Para por um fim a tudo isso, ou pelo menos amenizar é preciso tomar a atitude de acolher a graça da conversão. Digo acolher, pois essa graça paira sobre a humanidade. Enquanto pensarmos que a conversão parte apenas de uma decisão nossa, de um esforço pessoal, seremos como aquele viciado em cocaína que diz todos os dias com a seringa na mão: “eu paro quando eu quiser”. Entretanto, enquanto cada ser humano, desde o mais simples ao mais importante eclesiástico da face da terra, não ‘decidir-se pelo Reino de Deus’, acreditando que um anjo virá do céu para dizer-lhe: “vá em paz e não peque mais”, seremos como o louco que segura uma peneira debaixo de uma torneira que não jorra água. O pecado nós fazemos, a graça Deus dá. Como dizia um santo: “é necessário que você destrua o que você fez para Deus poder construir o que ele quer”, ou seja, como Deus vai ‘converter’ aquele que não quer ser ‘convertido’?
Sabemos, por uma simples experiência, que para a água passar do estado líquido para o estado gasoso é preciso ser elevada a mais de 100ºC, e isso deve ser ‘penoso, dolorido’. Ao que cabe perguntarmo-nos: Como queremos passar de um estado de pecado para um estado de graça com um simples estalar do ‘dedo de Deus’. Não foi esse o caminho ensinado por Jesus e pelos Apóstolos no início da Igreja, não adianta disfarçar nossa caminhada cristã tentando inventar modismos que não se adéquam ao Evangelho.
As pseudo-conversões, empobrecem a vida da comunidade cristã, pois gera diversos vícios no seu meio: pessoas que acham que são santas; pessoas que acham que todos os outros são pecadores; e pessoas que acham que nunca serão santas. E quantos outros erros não poderíamos destacar: os escrupulosos, os legalistas, os céticos.
Ao olharmos bem o Evangelho vamos ver que Jesus não via ninguém, ninguém mesmo, como ‘um santinho’, porém, não via ninguém como um ‘pecado nato’, irreconciliável. O que Ele apresentou, e isso vemos nitidamente na parábola do fariseu e do publicano, é que os bons deveriam cuidar para não se vangloriarem de sua condição e que os maus não deveriam se desesperar da sua condição. Podemos inferir aqui, que conversão pra Jesus, não é deixar definitivamente o pecado... mas sim reconhecer-se pecador, lutar com o pecado, e contar todos os dias com o auxilio da graça divina.

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